shutterstock_327214040Recentemente, escutei uma coordenadora pedagógica protestar sobre escolas de Educação Infantil em que livros e brinquedos ficam guardados em lugares altos para evitar que as crianças estraguem o acervo. Em algumas unidades do Ensino Fundamental a realidade é ainda pior: a ausência de livros e leitores marcam corredores e salas de aula. Como diz a educadora e pesquisadora espanhola Teresa Colomer, os estudantes precisam ser convidados a “andar entre livros”. Então, situações como essas precisam ser questionadas e transformadas.

Diante do protesto da coordenadora, lembrei imediatamente da grata experiência que tive quando recebi um pão quentinho em casa e, de brinde, apreciei um poema de Carlos Drummond de Andrade, publicado no saco de pão. O dono da padaria provavelmente não é educador. Mas, usando uma estratégia criativa, ele proporciona a leitura para seus clientes. Apesar de pagar um pouco mais pela estampa poética, o padeiro não cobra taxa extra, não seleciona os clientes entre os que sabem ler e os que não sabem. Simplesmente, oferece pão com poesia a todos. Lembro, ainda, de um grupo de voluntários de São Paulo que entregou livros às pessoas que pediam dinheiro nos semáforos da cidade e da ialorixá Mãe Stella de Oxóssi, da Academia de Letras do Brasil, que criou a biblioteca móvel Animoteca, aqui em Salvador.

Todas essas iniciativas partem de, pelo menos, dois pressupostos. O primeiro é o de que não se forma leitores sem livros. O segundo de que é possível apostar no caminho da sedução do leitor. Em Como um Romance (Editora Rocco, 167 págs., (11) 3170-4033, 18,20 reais), o francês Daniel Pennac discute e defende o leitor como um sujeito de direitos e de desejos e oferece pistas para novas tramas pedagógicas.

Será que a escola não poderia, também, oferecer a leitura em momentos assim, nos tomando de surpresa e enchendo de prazer? Os espaços de Educação formal, em muitos momentos, se distanciam do aprendizado das práticas sociais de leitura e escrita. No cenário contemporâneo brasileiro, formar leitores e escritores ainda é uma promessa – acontece de forma parcial, desigual e, por vezes, precária.

Poucas trajetórias leitoras se consolidam sozinhas. Claro que há casos singulares como o da escritora brasileira Carolina Maria de Jesus (1914-1977), que se tornou leitora com materiais encontrados no lixo e tornou-se uma autora premiadíssima com Quarto de Despejo. Mas, em geral, muitos estudantes precisariam ter o encontro com os livros mediado pela escola.

Inspirados por Daniel Pennac, podemos pensar em atividades como as bancas de leitura nas feiras livres realizadas pelos estudantes e professores, as tendas de contos africanos nas praças, a hora da leitura na rádio local, os saraus com a participação das avós, a publicação de catálogos de resenhas literárias, e as rodas de leitura na sala de aula.

Fonte: Neurilene Martins, NovaEscola