É comum dividir as escolas entre humanas, tecnológicas e focadas no vestibular, entre outras categorias. Apesar de bilíngue ser tratada como uma delas, as escolas que ensinam em mais de um idioma podem ter propostas pedagógicas bastante diferentes entre si.
Se o bilinguismo une as instituições em uma mesma categoria, mesmo nesse quesito elas podem ser bem diferentes. “Escolas bilíngues de qualidade não ensinam as línguas, mas ensinam pelas línguas. A segunda língua é tão importante quanto a primeira e tem os mesmos valor e espaço na escola. Ela é usada como ferramenta de comunicação nas aulas”, explica a pedagoga Selma Moura, mestre em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) e editora do blog Educação Bilíngue no Brasil (educacaobilingue.com).
Enquanto alguns colégios oferecem metade das disciplinas em cada língua, como o Stance Dual, outros usam o idioma estrangeiro para complementar o conteúdo, como o Play Pen – Escola Cidade Jardim.
“Conseguimos integrar os currículos. O aluno recebe a informação em uma língua e continua na outra, sem que o conteúdo apareça duas vezes. Os professores trabalham o planejamento e sabem que parte é de quem”, explica Matthias Meier, diretor-geral da PlayPen.
No colégio be. Living, não é muito diferente. Nas aulas em inglês, os estudantes recebem um complemento da matéria – sem repetir, mas também sem trabalhar assuntos completamente dispersos.
Para garantir uma convivência real com a língua estrangeira, os colégios mantêm nativos nas equipes pedagógicas.
“Temos professores de várias partes do mundo, para que os alunos não sejam apresentados a um sotaque só”, explica Ari Rahmilevitz, diretor administrativo da Stance Dual. A pedagoga Selma Moura ressalta que isso é bastante positivo. “A diversidade – linguística, cultural, social, étnica – é muito bem-vinda para construir igualdade nas escolas.”
Enquanto a be. Living, a PlayPen e a Stance Dual trabalham o bilinguismo português-inglês, o Colégio Humboldt leva o alemão para dentro da sala de aula. Lá, as turmas até o 4.º ano do ensino fundamental têm duas professoras. Uma fala português e a outra complementa o conteúdo em alemão. Depois disso, os alunos podem escolher o currículo em uma das línguas.
“Claro que a imersão total na língua estrangeira é boa para aprender a falar alemão ou inglês, por exemplo. Mas talvez para o desenvolvimento global da criança ela não seja tão boa assim”, afirma a coordenadora do Humboldt, Mariane Bischof.
Ela explica que a ideia é garantir que os alunos entendam a matéria. Se isso for feito mais facilmente em português, será em português; se for em alemão, a professora vai explicar em alemão.
Já na be. Living, na Stance Dual, na PlayPen e também nas escolas do grupo canadense Maple Bear, o inglês é o único idioma da educação infantil. “Não estamos aqui para ensinar a língua na aula. Nós usamos o inglês como instrumento. O professor não vai obrigar que o aluno fale, mas dá o retorno sempre em inglês para dar o modelo”, explica Patrícia Pavan, diretora pedagógica da be. Living. A alfabetização é feita primeiramente em português em todas as escolas citadas, o que é essencial para crianças que começaram a aprender a segunda língua a partir dos cinco anos, afirma Selma Moura.
Com estilo próprio. Mas o ensino nas escolas precisa ir muito além dos idiomas. Cada instituição tem seu método, assim como ocorre nos colégios em geral. Na PlayPen, por exemplo, é usado o International Primary Curriculum, que prevê o ensino dos conteúdos a partir de grandes temas e propõe objetivos específicos em cada matéria. “O programa internacional forma o estudante de uma maneira mais crítica em relação ao que acontece ao seu redor, para que ele seja, de fato, um cidadão do mundo”, defende Meier, da PlayPen.
A Maple Bear, por sua vez, trabalha nos moldes canadenses.
“O Canadá vai muito bem no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa). Só perde para algumas chamadas cidades-Estado, como a Coreia, onde os alunos passam mais tempo na escola”, explica Don Farrow, diretor acadêmico. Ele defende que o currículo das crianças deve priorizar o aprendizado pela descoberta.
“A escola deve dar as ferramentas para aprender. Para nós, não vale a pena roubar a infância para conseguir 40 pontos a mais em uma prova. O equilíbrio é mais importante.”
Na Stance Dual, o currículo é brasileiro. Entre as disciplinas ministradas em inglês estão Música, Natação, Informática e Teatro, além das matérias comuns do currículo. Alguns dos diferenciais para complementar a formação, segundo Rahmilevitz, são as aulas de robótica e as viagens que a escola oferece para imersão. Já no 3.º ano do ensino fundamental, quando as crianças começam a aprender espanhol como terceira língua, há a possibilidade de passar duas semanas na Argentina. No início do 9.º ano, a escola oferece um programa de dois meses no Canadá, morando na casa de uma família local.
A be. Living tem currículo brasileiro e metodologia que trabalha a partir de grandes temas, aprendidos em português e aprofundados em inglês.
“Muitos pais procuram o ensino bilíngue para os filhos pensando no mercado de trabalho. Nós olhamos para o bilinguismo agora, para o que é importante para a criança neste momento. O inglês pode ampliar, por exemplo, as possibilidades de uma pesquisa”, afirma Patrícia.
Filosofia da escola. Além do aprendizado curricular e da língua, os pais esperam que certos valores sejam ensinados para as crianças. Foi o que Ilci Aulicino encontrou na be. Living para a filha Júlia.
“Na hora de escolher, temos de pensar em que cidadão a escola quer formar”, diz. “Visitei outras, mas lá encontrei valores éticos e morais da maneira como eu queria criar a minha filha: solidariedade, compaixão, consumo consciente, valorização da singularidade e outros.”
A Stance Dual, por exemplo, trabalha sustentabilidade, voluntariado e tecnologia em diversos projetos. Em um deles, os alunos têm contato com a subprefeitura para a remodelação de uma praça. “A proposta da escola é formar cidadãos críticos e ativos, que possam agir criticamente nas questões sociais, culturais e ambientais da sociedade contemporânea”, afirma Rahmilevitz. Questões como coleta seletiva, uso responsável da água e desmatamento também fazem parte dos projetos dos estudantes. “É uma escola completa. Não prepara só para o vestibular, mas transforma as crianças em cidadãos do mundo, em pessoas que sabem se posicionar”, afirma Ruth Roysen, mãe de dois alunos da escola.
Priscila de Pádua Palácios tem dois filhos matriculados na PlayPen. O mais velho chegou a estudar em outra escola bilíngue, mas ela não considera que havia imersão total no inglês. Na PlayPen, encontrou o que buscava, além de um bom relacionamento com a direção. “Eles abrem espaço para a brincadeira, para as crianças se sujarem mesmo. Também tem leitura e uma área para as crianças ficarem sozinhas, o que é importante.”
Já na Humboldt, o foco é no encontro entre as culturas e os alunos, como explica a coordenadora. Carolina Sellmer tem duas filhas na escola e confirma. “Uma das coisas que eu mais gosto é que não há preocupação só com a língua, mas também com a imersão em outra cultura. Isso agrega muito, porque você percebe outras formas de viver e ganha com isso.
Via Estadão Educação